Há quem prefira terceirizar os serviços, ao invés de comprar aparelhos, equipamentos e softwares.

Parecido com um morcego, como o nome sugere, um drone Batmap rompe a névoa numa manhã clara da segunda semana de maio e risca o céu sobre uma vasta plantação de soja no município de Rio Verde, sudoeste de Goiás. Em quatro voos programados ao longo do dia, a pequena aeronave dotada de câmeras e sensores produz uma radiografia completa de uma área de 1,2 mil hectares de cultivo. O processamento das imagens gera um mosaico no qual é possível identificar talhões com stress hídrico, carência de adubação e infestações pontuais por ervas daninhas.

Com os mapas lançados no micro, o tecnólogo Rodrigo Meirelles emite as coordenadas que irão orientar os agrônomos nas ações em campo para corrigir as falhas detectadas na lavoura. “Sem esse recurso, o trabalho que fazemos em um dia demandaria de dez a doze dias”, afirma, evidenciando a rapidez como uma das vantagens do Batmap. Meirelles é diretor comercial da Drone Records Imagens Aéreas, empresa goiana especializada no uso de drones em soluções agrícolas, uma das tendências desse novo segmento.

Ao invés de investir na compra de drones e softwares, o produtor rural contrata o prestador do serviço. Na semana seguinte, o ‘morcego mecânico’ de Meirelles sobrevoava uma área de 10 mil hectares de milho na mesma região de Goiás. “Nesse caso, vamos analisar a biomassa, fazer a contagem de espigas e calcular a produtividade. Sairá um número extremamente preciso, bem mais do que se consegue por amostragem no campo.” No cultivo da terra, nem o céu parece ser limite.

Vistos até recentemente como “máquinas de grande potencial”, os drones são uma realidade no campo. Prestam-se a dezenas de operações e serviços, como captação de imagens, levantamento topográfico, mapeamento de lavouras, aplicação de fertilizantes, monitoramento de pragas, rebanhos, etc. O setor agrícola abriu novos horizontes para o emprego do equipamento, desenvolvido inicialmente para fins militares.

De acordo com dados do Decea – Departamento de Controle do Espaço Aéreo, o número de pedidos de análise para homologação de Vants – Veículos Aéreos Não-Tripulados subiu de 60 em 2012 para 400 em 2015, aumento de 660%. Em parte, o que explica esse crescimento é o uso cada vez maior na agricultura. Em alguns serviços, o drone tornou-se tão competitivo que passou a ser indispensável.

Um dos usos mais difundidos é o mapeamento e medição da área para demarcação do plantio e intervenções no terreno. O drone também é empregado para acompanhar em tempo real o desenvolvimento da lavoura. Voos regulares com registros por imagens permitem avaliar o crescimento das plantas, detectar pragas ou doenças, corrigir falhas no plantio, na aplicação de fertilizantes e a falta ou excesso de irrigação.

Tecnologia acessível

A concorrência entre fabricantes e prestadores de serviços tornou os preços menos salgados. Já se pode ter um equipamento de alta tecnologia na fazenda por valores entre R$ 3 mil – apenas o drone, importado – e R$ 60 mil, nesse caso, um pacote que inclui o equipamento, câmeras e sensores, treinamento de pessoal e software. Ainda assim, o custo é menor que o de um trator básico. Nessa faixa está o Batmap usado por Meirelles, um Vant desenvolvido pela DronEng, com sede em São Paulo.

O equipamento tem autonomia de 90 minutos, que permite mapear 4,2 mil hectares num único voo, e vem acompanhado de câmera de alta resolução. O CEO da empresa, Manoel Silva Neto, conta que dos dez modelos vendidos a partir de fevereiro deste ano, quatro foram diretamente para produtores agrícolas. “Os outros foram para empresas de topografia e meio ambiente, que também têm um pé no agro”, acrescenta. Neto explica que a empresa prefere comercializar o serviço completo, não apenas o equipamento.

“Desenhamos um modelo de negócio para vender a aeronave e dar todo o suporte para quem quer começar a usufruir dessa tecnologia.” Segundo ele, o Batmap compete com as melhores aeronaves importadas. “O drone é a plataforma, mas é importante que tenha tecnologia embarcada para fornecer dados de qualidade com agilidade. O valor agregado é a inteligência do sistema.”

Os drones produzidos no exterior também proliferam no mercado nacional. Alguns modelos são bastante acessíveis. A Agropecuária Canta Galo, de Campo Grande (MS), adquiriu um Vant da ‘família’ Phantom há dois anos para monitorar as áreas de pastagens e reflorestamento de eucalipto que se estendem por cerca de 6 mil hectares de sua fazenda, num dos extremos do município.

De acordo com sócio administrador João Vitor Nassif, inicialmente a aeronave era usada apenas para monitorar a floresta e as pastagens, detectando focos de incêndios, e para contar o gado. Com o uso, ele percebeu que, embarcando alguma tecnologia, poderia tornar seu Vant bem mais completo. Foi como o ágil Phantom 4 tornou-se um caçador de formigas. “As imagens saem perfeitas e identificam, tanto no eucalipto como no pasto, os pontos com lagarta e saúva.” O mapeamento fornece as coordenadas dos formigueiros e da praga, e uma equipe segue por terra para fazer a eliminação. Em abril, o drone identificou um ponto remoto do eucaliptal com as copas mais ralas. “

Aproximamos a imagem e descobrimos uma grande infestação por lagartas”, conta Nassif. Na inspeção por terra, segundo ele, dificilmente o ataque seria percebido sem já ter causado grandes estragos. No caso da pecuária, o drone é usado também para controlar a distribuição do rebanho nas pastagens. “Com as imagens, podemos dimensionar a qualidade e capacidade do pasto e observar a frequência com que os animais usam cada área.” O investimento, incluído o Vant e a câmera que já veio integrada ao equipamento, foi de aproximadamente R$ 7 mil.

Pulverização precisa

A febre do momento é habilitar o drone para aplicar agroquímicos com a precisão de um bisturi. O Brasil é o maior consumidor de agrotóxicos do mundo. Controlar a quantidade de agrotóxicos aplicados nas lavouras não é tarefa fácil. A pulverização é feita geralmente de forma homogênea e está sujeita a fatores meteorológicos, como a velocidade e direção do vento, que podem espalhar o produto para áreas vizinhas. É possível dirigir o equipamento ao talhão mais inacessível para máquinas, no centro da área cultivada, e tratar apenas alguns metros quadrados de lavoura sem desperdiçar uma gota.

É essa a principal função do Pelicano, o drone de pulverização desenvolvido pela gaúcha SkyDrones. “O equipamento foi pensado e desenvolvido para aplicações localizadas. Usamos o drone para mapear a área, identificar o problema e intervir de forma direta naquele ponto”, afirma Ulf Bogdawa, diretor da empresa.

A intervenção pontual, além de gerar aumento na produtividade, reduz os custos econômico e ambiental. “Deslocar um equipamento de pulverização sobre rodas para uma operação como essa acaba tendo um impacto tão significativo na lavoura que muitas vezes o produtor prefere arcar com o prejuízo da praga do que fazer o controle”, diz. Os drones são equipados com sensores de temperatura e com câmeras em RGB ou infravermelho que permitem voar durante a noite. Alguns equipamentos têm grande autonomia de voo. No combate de pragas, a pulverização de grande precisão reduz em até 60% o consumo de defensivos.

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O Pelicano transporta 10 litros e voa a 500 metros de altura, mas seu maior desempenho é nos voos de um a três metros da cultura, aplicando o defensivo exatamente no local programado. A aeronave alcança áreas consideradas perigosas para aviões maiores, como próximo de árvores e junto à rede elétrica. “Como o drone chega muito próximo da área a ser protegida, reduz-se o risco de o produto químico ser jogado em lugar errado, por isso é ideal para correções pontuais na lavoura em sistemas de agricultura de precisão”, diz Bogdawa. De acordo com a empresa, o equipamento ainda está em fase de testes com clientes estratégicos e parceiros, como a Embrapa Instrumentação.

Deriva controlada

No Instituto de Ciências Matemáticas e de Computação da Universidade de São Carlos, interior de São Paulo, os cientistas de computação Bruno Squizato Faiçal, Heitor Freitas e Jó Ueyma desenvolveram um sistema inteligente e autônomo de pulverização agrícola com drones de asas rotativas, na forma de hélices. O sistema ajusta a rota da aeronave de acordo com as condições meteorológicas. Esse ajuste é feito em tempo real, por meio do cruzamento de dados gerados pelos drones com os obtidos pelos sensores sem fios instalados às margens da área a ser pulverizada.

Antes de iniciar a pulverização, o drone faz um voo de reconhecimento para coletar informações que irão permitir a “tomada de decisões” durante a aplicação. Os sensores enviam dados sobre vento, temperatura e umidade do ar. “A intenção é prever exatamente onde o agrotóxico vai cair”, explica Faiçal Professor da Universidade Estadual do Norte do Paraná, ele lembra que o sistema independe de controlador em terra e está em fase de patente. O protótipo tem 20 minutos de autonomia de voo e carrega 600 ml de produto. “Para a fase comercial, vamos precisar de uma aeronave maior”, disse. A ideia é trabalhar com produtos de ultra baixo volume para pulverizações bem localizadas.

“Consideramos como ideal um modelo que leve de 30 a 40 litros de produto suficiente para tratar 30 hectares. Segundo ele, entre as vantagens estão a precisão na aplicação do insumo, redução de custo e risco, e ganho ambiental. O grupo de pesquisadores já foi procurado por uma empresa citrícola, interessada em utilizar o sistema para pulverização da borda de pomares, por onde as pragas geralmente entram.

Para Giovani Amianti, CEO da brasileira XMobots, uma das pioneiras no mercado de drones para agricultura, os avanços da nova tecnologia no mapeamento das áreas agrícolas podem ser considerados uma revolução. “É uma inovação que nos deu maior precisão no manejo das lavouras, ganho de produtividade, redução significativa de custos e horas trabalhadas.”, disse. Como exemplo, cita que um projeto de terraceamento para lavoura de cana com drone chega a ser 80% mais barato que no sistema convencional.

O empresário cita ainda o impacto do uso de drones na redução da quantidade e em aumento na eficiência da coleta de amostras para aplicar corretivos ou dimensionar a produção em lavouras de soja. As câmeras registram os pontos de maior atividade biofotossintética e permitem a padronização das áreas onde serão coletadas amostras. “É possível identificar as áreas que precisam de correção com um número muito menor de amostras.

Menos coleta é igual a menos custos”, disse. Segundo Amianti, as empresas do agronegócio entenderam que o caminho para superar a crise é a redução de custos e isso passa pelo investimento em automação e inovação. “Acredito que o Vant está sendo esse canal, até porque as empresas estão capitalizadas e querem investir em tecnologia.” A própria XMobots é prova de que o segmento dos drones já decolou.

Somente do Arator, o campeão de vendas, estão sendo comercializadas até 15 unidades por mês, a preços que vão de R$ 90 a R$ 180 mil, conforme a configuração. Outro modelo, o Echar, desenvolvido para áreas maiores, custa de R$ 200 mil a R$ 350 mil, dependendo dos opcionais. Segundo Amianti, entre 50 e 100 unidades já operam principalmente em Mato Grosso e Tocantins.
Revolução no campo

O grande salto, segundo o empresário, será dado com a habilitação dos drones para fazer pulverização dirigida, uma rotina daqui a dois anos, em sua opinião. Amianti ressalva que o equipamento não vai substituir a aplicação com trator ou o avião agrícola nas grandes culturas. “Acredito que o Vant vai trabalhar cada vez mais integrado com o trator e outras máquinas. É uma ferramenta para aplicação pontual e localizada.”

A XMobots já avançou nessa direção desenvolvendo helicópteros não tripulados para fazer a pulverização de lavouras em manchas previamente definidas. Os modelos Daxi 10A e Daxi 50A, criados em parceria com a Geo Agri Tecnologia Agrícola, foram apresentados no Drone Show, no início de maio, em São Paulo. Desenvolvidos ao longo dos últimos quatro anos, os equipamentos foram pensados para atuar em áreas de risco e de difícil acesso, como encostas, montanhas e talhões de lavouras onde não é possível a entrada de máquinas. ““Este é o ano da entrada das tecnologias de pulverização dirigida”, conclui Amianti.

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Pulverização com helicóptero

Em fevereiro, pela primeira vez no Brasil, um helicóptero (no caso, um Robinson R44 pertencente à Climb Aircraft Division, sediada no município paulista de Monte Mor) foi homologado pela Anac para pulverizar lavouras. A modalidade, conhecida como asa rotativa, chegou a ser usada 30 anos atrás, mas, por problemas de custos e dificuldades técnicas, não vingou, deixando as aplicações aéreas aos aviões. Agora, com aeronaves modernas e tecnologicamente adaptadas, o helicóptero volta a ser opção para pulverização, sobretudo em locais de difícil acesso.

Segundo o coordenador de operações da Climb, Rafael Machado, o fato de voar mais baixo, e mais lentamente, aumenta a eficácia da pulverização e reduz as perdas. “O ar gerado pela rotação das hélices abre a vegetação, direcionando o agroquímico”. Outra vantagens, segundo ele: aplicações em encostas ou à noite, período em que muitas pragas saem para se alimentar.” Machado também relaciona ganhos operacionais, pois o helicóptero não precisa de pista para decolar ou pousar.

A operação ideal exige um caminhão (de preferência, com baú reforçado, capaz de servir de ponto de pouso dentro da lavoura) equipado com sensores meteorológicos, tanque de pré-mistura, água, combustível e produtos químicos, para reabastecimento no próprio campo, sem necessidade de translado até a pista mais próxima, como acontece com o avião.

A Climb mantém parcerias com grandes empresas do setor, como a Syngenta e a Bayer. O especialista em tecnologia de aplicação de agroquímicos da Bayer, Paulo Rosa, analisou uma aplicação aérea feita com helicóptero em culturas de soja e milho na fazenda Agromartendal, em Água Doce (SC), e considerou animadores os resultados, comparativamente às aplicações por avião. “Vi vantagens no helicóptero pela maior deposição e redução de deriva, além da boa penetração de gotas no perfil das lavouras”.Conforme dados da National Agricultural Aviation Association, 13% da pulverização aérea nos Estados Unidos já são feitos com helicópteros, o que representa 71 milhões de hectares.

Voos irregulares

10356Estima-se que a maior parte dos drones que voam pelas fazendas do Brasil ainda esteja fora da lei. O problema é que a regulamentação para essas aeronaves continua em estudo pela Anac – Agência Nacional de Aviação Civil. Segundo o capitão Jorge Alexandre de Almeida Regis, do Cindacta – Centro Integrado de Defesa Aérea e Controle do Tráfego Aéreo, em setembro de 2015 a Anac apresentou o regulamento brasileiro da aviação civil especial que dispõe sobre os Vants, mas ainda falta transformar em lei.

A Secretaria de Aviação Civil do governo federal criou um grupo de estudo para debater a questão. Também foi editado um guia para fiscalização de operações de aeronaves não tripuladas. Entre as exigências, é necessária a homologação do equipamento pela Anac, que emite um certificado de autorização para o voo. No caso de drones pilotados remotamente, é preciso ainda homologar a frequência dos sinais na Anatel. Os documentos devem ser enviados para o Decea – Departamento de Controle do Espaço Aéreo.

Regra baixada pela Anac, válida também para drones recreativos, é a distância mínima dos aeroportos, consideramdo sua área de influência: de 5,6 km para aparelhos com até 2 kg, incluindo câmeras, e de 9,3 km para drones de 2 a 25 kg. Há ainda uma lacuna a ser preenchida: o Vant autônomo, que uma vez programado não permite intervenção externa em seu voo, continua proibido no Brasil.

*Matéria originalmente publicada na edição 78 da Revista Agro DBO, em junho de 2016.

 

Fonte: Revista Agro DBO

 

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6 thoughts on “Drone, Tomando conta da agricultura !

  1. Eu gostaria de receber um contato de alguma empresa que forneça o sistema de levantamento pecuário de precisão, onde minha principal necessidade é de realizar a contagem do gado por meio de drone .

  2. Muito legal.
    Me diz uma coisa estou a nível universitário e gostaria de entrar nesta área. Existe a possibilidade de realização de mapeamentos pequenos com um equipamento tal como o Dji 3 Phantom 3 Standard?
    Obrigado

    1. Mateus,

      Se a ideia é divulgar os seus cursos da Droneng esse não seria um meio ideal com os backlinks.

      Mais a resposta é sim, da pra fazer o mapeamento.

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