Uso de drone sozinho não resolve, é preciso técnica avançada para análise da imagem aérea
Com o advento dos Veículos aéreos não tripulados (VANTs) – também conhecidos como drones – veio à tona o desafio de desenvolver programas computacionais para aquisição, tratamento e análise das imagens captadas por
máquinas fotográficas embarcadas, porque os aparelhos por si só não identificam pragas e doenças, como muitos acreditam.
“São necessários sistemas poderosos para reconhecer padrões”, diz o pesquisador da Embrapa Instrumentação (São Carlos – SP), Lúcio André de Castro Jorge, que utiliza técnicas avançadas de geoprocessamento para interpretar as imagens, transformando-as em dados úteis para o produtor.
A popularização do drone abriu um novo leque de oportunidades em vários campos. Para o produtor rural, que inspecionava a lavoura percorrendo os talhões a pé, o equipamento é um aliado. No entanto, de acordo com o pesquisador, é preciso atenção e não comprar a ideia de que o aparelho resolve tudo e que qualquer drone é bom.
Na chamada agricultura de precisão, sistema que leva em consideração a gestão espacial da lavoura, o VANT vem sendo empregado com a ajuda de acessórios fundamentais embarcados, como as câmeras fotográficas multiespectrais e hiperespectrais, de alta resolução, com sensores infravermelho, que permitem identificar pragas e doenças precocemente.
O assunto é pauta de discussões no Congresso Brasileiro de Agricultura de Precisão (ConBAP), onde Castro Jorge vai traçar um panorama sobre plataformas aéreas para sensores – VANTs e drones – mitos, verdades e perspectivas que ainda cercam o emprego agrícola desses aparelhos.
Realizado de 4 a 6 de outubro, na Universidade Federal de Goiás, em Goiânia, o evento se traduz em um fórum de discussão bianual que reúne estudiosos, pesquisadores, extensionistas, fornecedores e usuários das diferentes técnicas envolvidas no amplo leque da Agricultura de Precisão (AP).
O pesquisador também vai mediar um painel setorial sobre imagens e sensoriamento remoto, enquanto o coordenador da Rede de Agricultura de Precisão da Embrapa, Ricardo Inamasu, que compõe o comitê científico do Conbap, será responsável por outro sobre “Dados – quem gera, quem usa e a quem pertencem”.
“Investimos na criação de metodologias de processamento de imagens para drones de baixo custo capazes de operar em condições de campo adversas”, diz Castro Jorge, que há duas décadas desenvolve pesquisas em software para uso, a princípio, em imagens captadas por qualquer aeronave.
Para ele, as imagens tomadas por VANTs, aliadas a uma boa técnica de geoprocessamento, identificam com precisão na lavoura a existência de pragas e falhas, problemas de solo, áreas atingidas por erosão e assoreamento de rios, área atacada com nematoide, deficiência hídrica, porque um programa de computador indica com cores específicas esses problemas que provocam prejuízos nas propriedades.
Técnicas de análise
As técnicas desenvolvidas pelo pesquisador para o tratamento das imagens estão sendo empregadas em cultura de cana, citros, milho e algodão, em diversas regiões do país. Em Gavião Peixoto (SP), o engenheiro eletrônico está conduzindo estudos com VANTs para diagnóstico de uma doença que é considerada a mais importante, severa, séria, destrutiva e devastadora da citricultura mundial – o HLB (Huanglongbing), conhecida como greening.
No Estado de São Paulo, entre 2005 e 2012, a praga foi a causa da eliminação de 26,7 milhões de plantas segundo os dados divulgados pela Coordenadoria de Defesa Agropecuária (CDA), baseado nos relatórios de inspeção e erradicação de plantas que os produtores entregam semestralmente.
Softwares customizados estão sendo usados por uma multinacional americana do ramo de agricultura e biotecnologia para avaliação de híbridos de milho, enquanto um dos maiores grupo brasileiro produtor de algodão estuda o emprego da tecnologia, em caráter experimental, para analisar a influência de nitrogênio no desenvolvimento do algodão ou deficiência nutricional da planta. Mais de duas mil fotos já foram captadas por drones em propriedade do grupo, em Goiânia.
As fotos serão processadas com a ajuda do software Siscob – usado para análise de cobertura sobre o solo – e de outros que estão sendo desenvolvidos, especificamente para avaliação da cultura de algodão.
Uma vez obtidas, as imagens podem ser processadas individualmente com o objetivo de reconhecer falhas graves de plantio que ainda permitem correção. Um exemplo são as falhas na linha de plantio de cana-de-açúcar superiores a 50 cm. Com o software “contador de falhas”, que está em fase de validação junto aos produtores, será possível interpretar ocorrências na lavoura.
Uso adequado
Para um bom uso da VANT, as dicas de Castro Jorge são cumprir algumas etapas, como planejamento de voo, voo com sobreposição, obtenção das imagens georeferenciadas, processamento das imagens, geração de mosaico, análise em uma ferramenta GIS – um sistema de informação geográfica – até chegar a geração de relatórios com interpretações das imagens captadas pelo aparelho.
“Com essas informações em mãos, o produtor poderá elaborar os mapas de recomendações, como descompactação, fertilidade e aplicação de insumos a taxa variável, auxiliando nas tomadas de decisões”, avalia o pesquisador.
Algumas ferramentas estão disponíveis gratuitamente para os agricultores na páginahttp://labimagem.cnpdia.embrapa.br/, como o sistema para análise da cobertura do solo – Siscob – e sistema de coleta geolocalizada – GeoFielder.
Mercado
Os veículos aéreos não tripulados são os destaques do momento. Mais de 40 países tem trabalhado no desenvolvimento desses aparelhos para diferentes mercados, com cifras bilionárias. Estudo do The Global UAV Payload Marker 2012-2022, realizado pela empresa RnR Market Research, divulgado no final de 2012, aponta que o mercado global de VANTs está em 43,7 bilhões de dólares, mas a previsão é que o setor movimente em torno de 68,6 bilhões em 2022.
O crescimento vem justamente na esteira dos avanços recentes da tecnologia computacional, desenvolvimento de software, materiais mais leves, sistemas globais de navegação, avançados links de dados, sofisticados sensores e miniaturização.
Pioneirismo na agricultura
No Brasil, os primeiros relatos de vants ocorreram na década de 80, quando o Centro Tecnológico Aeroespacial (CTA) desenvolveu o projeto Acauã, para fins militares especificamente. Na área civil, também na década de 80, se destaca o projeto Helix, um vant de asa móvel que foi desativado nos anos seguintes. Mais tarde, o Centro de Tecnologia da Informação Renato Archer (Cenpra) desenvolveu o projeto do dirigível Aurora, que serviu para capacitar a equipe de desenvolvimento.
Na agricultura, a Embrapa Instrumentação é pioneira no emprego de veículos aéreos não tripulados, tendo iniciado pesquisas com o emprego destes aparelhos em 1998. A proposta era substituir as aeronaves convencionais, utilizadas na obtenção de fotografias aéreas, para monitoramento de áreas agrícolas e áreas sujeitas a problemas ambientais, por vants de pequeno porte que realizassem missões pré-estabelecidas pelos usuários.
Desde então a Embrapa investiu no desenvolvimento de outras plataformas e aeronaves que fossem capazes de operar em condições de campo adversas, como as áreas agrícolas, porém com bom desempenho e baixo risco.
A pesquisa está focada em duas frentes, no desenvolvimento de softwares e sistemas de captura de imagens adequados às diversas aplicações agrícolas, para diferentes escalas, de pequenas a grandes propriedades. Os testes estão sendo realizados em diversos modelos de aeronaves, como os sistemas multirrotores, os chamados multicópteros, todos embarcados com software livre, que são uma opção tecnológica mais barata para pequenas áreas.
Alguns testes são realizados em área do Laboratório de Referência Nacional em Agricultura de Precisão, em São Carlos, inaugurado em 2013, como um espaço inédito para pesquisar e desenvolver equipamentos, sensores, componentes mecânicos e eletrônica embarcada, em um mesmo local.
Joana Silva
Embrapa Instrumentação
FONTE GRUPO CULTIVAR